Dio Adawale controlava a logística global de três continentes. Ela não lidava com atrasos. Ela não lidava com surpresas. E ela certamente não lidava com o passado. Mas no Terminal 4 do JFK, o passado não apenas a alcançou. Ele a encarou de volta com seus próprios olhos.

O ar no terminal de aviação privada geralmente cheirava a café expresso caro e silêncio filtrado. Era o cheiro da vida de Dio: limpo, eficiente e totalmente desprovido de atrito. Mas hoje, uma tempestade histórica havia bloqueado todos os voos fretados, forçando o desvio dos voos de chegada para o terminal internacional principal.

Dio não lidava com terminais principais. Ela não lidava com filas. Ela não lidava com espera. E ela certamente não lidava com a umidade caótica de cinco mil estranhos respirando o mesmo ar reciclado.

— O carro chega em três minutos, Sra. Adawale — disse seu assistente, Marcus, digitando furiosamente em seu tablet enquanto caminhavam apressadamente pelo saguão de desembarque. — Já contatei o conselho. A reunião da fusão em Manhattan foi adiada para as 16h. A senhora tem tempo para se trocar.

Dio ajustou as lapelas de seu casaco de caxemira creme, o rosto obscurecido por óculos escuros enormes que custavam mais do que o Honda Civic parado no meio-fio lá fora. Ela tinha trinta e dois anos, era CEO da Aether Systems e estava listada pela Forbes como uma das mulheres mais assustadoramente competentes na logística global. Ela se movia com a graça aerodinâmica de um tubarão em águas abertas.

— Certifique-se de que o carro esteja aquecido, Marcus — disse Dio, sua voz um contralto baixo e suave. — E consiga as projeções do terceiro trimestre. Não quero entrar naquela sala de reuniões às cegas só porque o clima decidiu fazer birra.

— Já estão na sua caixa de entrada.

Eles cortavam o cruzamento caótico dos desembarques internacionais, desviando de famílias se reunindo com abraços chorosos e turistas lutando com bagagens enormes. Dio olhava para frente. Ela tratava a multidão como código — obstáculos a serem contornados. Ela não sentia nada pelas demonstrações de emoção ao seu redor. “Custo emocional” era ruim para os negócios. Ela havia extirpado essa parte de si mesma há cinco anos. Cortou-a com um bisturi feito de ambição e luto.

Ela olhou para o relógio. Um Patek Philippe. 13h15.

— Espere — murmurou Marcus, desviando de um carrinho de bagagem.

Dio desviou de um grupo de mochileiros, sua paciência se esgotando. Ela olhou para cima para localizar as placas de saída, seu olhar varrendo o mar de cabeças.

E então o mundo parou.

Não foi poético. Foi um solavanco físico, como a pressão da cabine caindo a quarenta mil pés. Sua respiração travou na garganta, uma inspiração aguda e dolorosa que congelou seus pulmões.

Ele estava parado perto da esteira de bagagens de um voo vindo de Seul. Usava um moletom cinza simples e uma jaqueta jeans, parecendo exausto. Seu cabelo — aquele cabelo preto como tinta, espesso, onde ela costumava passar os dedos — estava um pouco mais comprido do que ela lembrava, caindo desordenadamente sobre a testa. Ele parecia mais velho. Havia linhas finas ao redor dos olhos que não existiam cinco anos atrás. Mas o maxilar era o mesmo. A maneira como ele sustentava os ombros, carregando o peso do mundo com uma graça estoica e silenciosa, era a mesma.

Daniel Choi.

Dio parou de andar. A multidão fluía ao seu redor como água em torno de uma pedra, esbarrando em seus cotovelos, murmurando desculpas que ela não ouvia.

— Sra. Adawale? — perguntou Marcus, parando alguns metros à frente e se virando. — Está tudo bem?

Dio não conseguia falar. Seu coração, geralmente um metrônomo constante de disciplina, martelava contra as costelas com força violenta e errática. Dan. Aqui em Nova York. O homem de quem ela se divorciara. O homem que ela amara com uma ferocidade que quase a destruíra. O homem que fora embora quando a vida dela desmoronou em pó.

Ela deveria se virar. Deveria sinalizar para Marcus, atravessar a multidão, entrar no carro e se enterrar nos relatórios trimestrais. Esse era o protocolo Dio Adawale.

Mas então Dan se moveu. Ele se agachou, e o sangue de Dio virou gelo.

Ele não estava sozinho.

De pé, de cada lado dele, agarradas à barra de sua jaqueta jeans, estavam duas garotinhas. Eram idênticas, talvez quatro ou cinco anos de idade. Usavam casacos rosa combinando e pequenos tênis brancos que acendiam luzes de LED quando mudavam o peso do corpo.

Mas não foram as roupas que fizeram o chão sob os saltos de Dio parecer que estava se dissolvendo. Foram os rostos.

Elas tinham os olhos de Dan — escuros, amendoados, intensos — mas tinham o nariz de Dio. Tinham a boca dela. O cabelo era uma profusão de cachos grossos e escuros puxados em dois “puffs” no topo da cabeça, balançando enquanto apontavam para a esteira de bagagens. A pele delas era de um bronze rico e quente, uma mistura perfeita e contínua de melanina profunda e marfim pálido.

Dio piscou, certa de que estava alucinando. Isso era um sonho de estresse. Era o resultado de três dias sem dormir e cafeína demais.

Uma das meninas puxou a manga de Dan e disse algo em coreano. Dan sorriu — um sorriso cansado e gentil que Dio não via há meia década — e afastou um cacho da testa da menina. Ele respondeu algo, a mão demorando-se protetoramente no ombro dela. O gesto foi tão íntimo, tão praticado, tão paternal, que abriu um buraco no peito de Dio.

— Sra. Adawale, o motorista está…

— Quieto — sibilou Dio, a palavra saindo dela como um estalo de chicote.

Ela deu um passo à frente, depois outro. Suas pernas pareciam pesadas, desajeitadas, como se estivesse andando em concreto úmido. Ela empurrou um homem com uma caixa de violoncelo, ignorando sua indignação. Ela tinha que chegar mais perto. Ela tinha que ver.

A segunda menina, a da esquerda, olhou para cima. Seus olhos examinaram a multidão, entediados, até pousarem em Dio. A garotinha congelou. Ela inclinou a cabeça, sua expressão mudando de tédio para confusão. Ela tocou a perna de Dan com mais força dessa vez, apontando um dedo pequeno diretamente para Dio.

Dan se virou.

No momento em que seus olhos se encontraram, o barulho do terminal — os anúncios, os bebês chorando, o ronco das rodas das malas — desapareceu. Era apenas um vácuo de silêncio se estendendo entre eles.

Dan empalideceu. Visivelmente, totalmente pálido. A cor drenou de seu rosto tão rápido que parecia que ele ia desmaiar. Seu aperto no carrinho de bagagem aumentou até os nós dos dedos ficarem brancos. Ele olhou para Dio. Depois olhou para as meninas e, instintivamente, deu um passo à frente delas, protegendo-as com seu corpo.

Aquele movimento quebrou Dio. Aquele movimento defensivo, aquele instinto de protegê-las dela, estilhaçou a parede de vidro que ela havia construído em torno de suas emoções.

Dio fechou a distância. Ela não se importava com a reunião do conselho. Ela não se importava com as aparências. Ela parou a um metro dele.

— Dan — ela sussurrou. Sua voz soava destruída, estranha aos seus próprios ouvidos.

— Dio — respondeu ele. Sua voz era áspera, cautelosa. Ele não sorriu. Ele parecia aterrorizado.

O olhar de Dio caiu para as meninas espiando por trás das pernas dele. De perto, a semelhança era inegável. Era científico. Era um fato biológico, encarando-a de frente. Elas eram a síntese perfeita das duas pessoas paradas naquele círculo de tensão.

— Quem são elas? — perguntou Dio, a voz trêmula.

Dan engoliu em seco. — Devemos ir. Não podemos fazer isso aqui.

— Quem são elas, Dan? — Sua voz subiu, afiando-se. A CEO estava ressurgindo, exigindo dados, exigindo a verdade.

— Dio, por favor — implorou ele, examinando a multidão como se procurasse uma rota de fuga. — Aqui não.

— Elas são…? — Ela não conseguiu terminar a frase. A matemática não batia. A linha do tempo não batia. Cinco anos atrás, eles haviam perdido o bebê. Ela acordara naquela cama de hospital, quebrada e vazia, e os médicos disseram que não havia batimentos cardíacos. Sua mãe segurou sua mão e disse que era para o melhor. Dan tinha ido embora.

— Dio — disse Dan, a voz caindo para um sussurro ríspido. — Elas são minhas filhas.

— Suas filhas — ela repetiu. Ela olhou para as meninas. A menina da direita a encarou de volta com olhos que eram espelhos dos de Dio. — Quantos anos elas têm?

Dan não respondeu imediatamente. Ele parecia um homem no cadafalso. — Elas acabaram de fazer quatro anos.

Quatro.

Dio fez o cálculo mental instantaneamente. Quatro anos de idade. Isso significava que a concepção foi há quase cinco anos. Logo antes do acidente. Logo antes do divórcio. Logo antes do aborto espontâneo.

O mundo inclinou em seu eixo. Uma onda de náusea a invadiu.

— São gêmeas — disse Dio, a compreensão a atingindo como um golpe físico. — Eu estava… Eu estava grávida de gêmeos.

— Você não sabia? — perguntou Dan. A pergunta foi suave, entrelaçada com uma confusão que igualava a dela, mas sublinhada por uma raiva profunda e defensiva. — Não finja que não sabia, Dio. Você assinou os papéis.

— Que papéis? — Dio se aproximou, as mãos fechando em punhos ao lado do corpo. — Me disseram que perdi o bebê, Dan. Me disseram que não havia batimentos cardíacos. Eu enterrei uma caixa com nada.

A acusação pairou no ar, afiada e irregular.

A garotinha da esquerda puxou o jeans de Dan. — Appa, quem é a moça? — perguntou ela em inglês perfeito, embora com sotaque forte.

Dan olhou para a filha, a dor criando sulcos profundos ao redor de sua boca. Ele olhou de volta para Dio, examinando seu rosto, procurando a mentira. Mas Dio Adawale não mentia. Ela manipulava, ela traçava estratégias, mas não mentia sobre fatos. E o horror cru e sangrento em seu rosto era um fato que ele não podia ignorar.

— Disseram que elas morreram? — perguntou Dan, a voz trêmula.

— Sim — engasgou Dio, as lágrimas finalmente transbordando, quentes e ardentes contra suas bochechas frias. — Minha mãe… ela disse que perdi o bebê no acidente. Ela disse que você não conseguiu lidar com o luto. Ela disse que você foi embora.

Dan soltou um som que foi meio risada, meio soluço. Ele passou a mão pelo rosto, olhando para as luzes fluorescentes do terminal como se rezasse por força.

— Ela me disse que você não as queria — disse Dan, seus olhos voltando para encontrar os dela, duros e acusadores. — Sua mãe me deu a custódia total. Ela disse que você queria focar na empresa. Ela disse que um escândalo de raça mista e dois bebês arruinariam sua ascensão a CEO. Ela me trouxe os papéis de renúncia, Dio. Com a sua assinatura neles.

— Eu nunca assinei nada — sussurrou Dio. — Eu fiquei em coma por três semanas, Dan.

O silêncio que se seguiu estava pesado com os fantasmas de cinco anos de tempo perdido. A compreensão atingiu os dois ao mesmo tempo. A manipulação. O roubo. Os anos roubados.

Dio olhou para as meninas novamente — suas filhas — vivas, respirando, usando tênis que piscavam e olhando para ela como se fosse uma estranha.

Ela caiu de joelhos. Foi um movimento deselegante, desesperado, arruinando o casaco de caxemira no chão sujo do aeroporto. Ela se colocou na altura dos olhos delas. As meninas recuaram contra as pernas de Dan, desconfiadas dessa mulher bonita e chorosa de óculos escuros.

Dio tirou os óculos. Seus olhos estavam vermelhos, aterrorizados e desesperados.

— Oi — ela sussurrou, a voz falhando.

A menina da direita, a mais corajosa, deu meio passo à frente. Ela olhou para Dio, depois para Dan, depois de volta para Dio.

— Você parece comigo — disse a garotinha desconfiada.

— Sim — soluçou Dio, uma risada escapando de sua garganta. — Sim, eu pareço. Eu me pareço exatamente com você.

Dan estava de pé sobre elas, a mão ainda no carrinho de bagagem, seu mundo se desfazendo tão rápido quanto o dela. — Dio, temos um voo de conexão para Boston. Temos que ir.

Dio se levantou lentamente. O choque estava diminuindo, substituído por uma fúria fria e ardente dirigida às pessoas que haviam feito isso com ela, e uma necessidade feroz e possessiva de nunca mais deixar aquelas três pessoas saírem de sua vista.

— Vocês não vão para Boston — disse Dio. O aço estava de volta em sua voz, mas temperado agora, fundido com algo mais forte.

Marcus, seu assistente, materializou-se da multidão, parecendo ansioso. — Sra. Adawale, a fusão…

— Cancele a reunião. Cancele o conselho. Cancele tudo pela próxima semana.

— Mas…

— Eu disse cancele! — rugiu Dio, fazendo um turista próximo pular. Ela se virou para Dan, os olhos flamejantes. — Vocês vêm comigo. Meu carro está lá fora.

— Dio, você não pode simplesmente nos dar ordens — disse Dan, embora sua resistência fosse fraca. Ele parecia em estado de choque.

— Elas são minhas filhas, Dan — disse ela, a voz caindo para uma calma letal. — Perdi quatro anos da vida delas porque alguém as roubou de mim. Não vou perder mais quatro minutos. — Ela estendeu a mão, pairando no ar, esperando por ele. — Por favor. Venha comigo. Deixe-me… deixe-me explicar. Deixe-me entender.

Dan olhou para a mão dela. Depois olhou para as filhas. Olhou para a exaustão no rosto delas. Olhou para a mulher que ele nunca realmente deixara de amar, parada nas ruínas de uma mentira massiva.

Ele soltou o carrinho. — Ok — sussurrou ele. — Ok.

Dio soltou um fôlego que parecia estar segurando há cinco anos. Ela olhou para as gêmeas.

— Eu sou a Dio — disse ela suavemente para elas. — Sou… sou uma amiga do seu Appa.

Ela ainda não estava pronta para dizer “mãe”. Ela não tinha merecido isso. Mas enquanto se virava para conduzi-los em direção à saída, em direção ao seu carro que esperava e ao acerto de contas que se seguiria, Dio Adawale sabia de uma coisa com certeza: ela queimaria o mundo para merecê-lo.

O trajeto até Manhattan foi sufocante.

O Maybach de Dio foi projetado para conforto — assentos com massagem, chassi com cancelamento de ruído, um frigobar abastecido com água com gás — mas, naquele momento, parecia uma câmara de compressão. A divisória estava levantada, separando-os do motorista, selando-os em uma cápsula de silêncio de alta tensão.

Dan sentou-se no banco oposto, o corpo inclinado protetoramente em direção às gêmeas. As meninas, Ari e Amara, estavam de olhos arregalados, os dedinhos traçando o grão macio dos apoios de braço de couro. Elas sussurravam uma para a outra em coreano, apontando para o horizonte de Queens que passava, aparentemente alheias ao fato de que a mulher sentada à frente delas — a mulher que parecia uma versão aterrorizante e cara delas mesmas — as encarava como se fossem fantasmas.

Dio não tinha tirado o casaco. Ela sentia frio, um calafrio profundo nos ossos que nada tinha a ver com o inverno de Nova York.

— Elas estão com fome — disse Dan. Foi a primeira coisa que ele disse em vinte minutos. Ele não olhou para ela. Estava vasculhando uma mochila gasta. Tirou um saco de biscoitos de camarão.

— Posso pedir para Marcus encomendar qualquer coisa — disse Dio, a voz soando alta demais na cabine silenciosa. — O que elas quiserem. Estaremos na cobertura em dez minutos.

— Biscoitos estão bem — disse Dan secamente. Ele abriu o pacote e entregou às meninas. O som do plástico amassando parecia ensurdecedor.

Dio observou Ari, aquela com o olhar mais ousado, mastigar um biscoito enquanto olhava abertamente para os brincos de diamante de Dio.

— Amara é alérgica a amendoim — acrescentou Dan, a voz inexpressiva. — Só para você saber. Se for pedir comida.

Dio estremeceu. Amara. O nome a atingiu como um tapa físico. Ela não sabia disso. Ela não sabia que sua filha era alérgica a amendoim. Ela não sabia sua cor favorita. Ela não sabia se ela dormia com uma luz noturna. Ela não sabia nada.

— Eu não sabia — sussurrou Dio.

Dan finalmente olhou para ela. Seus olhos eram duros, o olhar romântico e suave do homem com quem ela se casara substituído pela armadura cansada de um pai solteiro. — Há muito que você não sabe, Dio. E muito que eu não sei. Mas agora, eu só preciso saber de uma coisa.

— O quê?

— Estamos entrando em uma armadilha? — perguntou Dan, gesticulando para o carro, a cidade, a riqueza ao redor deles. — Porque da última vez que interagi com sua família, fui ameaçado com um processo e uma ordem de restrição se tentasse contatá-la novamente.

Dio endireitou a coluna. A menção de sua família, especificamente de sua mãe, acendeu uma pequena chama quente de raiva em suas entranhas. Era um sentimento familiar, um que ela conseguia controlar.

— Sem armadilhas — disse Dio com firmeza. — Apenas respostas. Meu apartamento é o único lugar onde posso garantir privacidade. Se formos para um hotel, a imprensa estará lá em uma hora. Se formos a um restaurante, as pessoas tirarão fotos. Eu preciso… preciso entender como isso aconteceu, Dan. Preciso ver os papéis.

O carro parou no meio-fio da Obsidian Tower em Tribeca. O porteiro abriu a porta, os olhos se arregalando ligeiramente ao ver o homem casual e de aparência frenética e as duas crianças saindo do veículo da Sra. Adawale.

— Bagagens para a cobertura, Henry — ordenou Dio, passando por ele. — E peça duas pizzas grandes. Queijo e pepperoni. Sem amendoim. Nenhum tipo de noz no prédio.

— Sim, Sra. Adawale.

A subida no elevador foi um borrão. Quando as portas se abriram diretamente em sua sala de estar, o contraste entre a vida dela e a de Dan tornou-se ainda mais gritante. A cobertura era uma obra-prima do minimalismo: pisos de mármore branco, janelas do chão ao teto com vista para o Hudson, esculturas abstratas de aço e absolutamente nenhum calor humano. Era uma casa projetada para uma mulher que passava quatorze horas por dia no escritório.

As gêmeas hesitaram na soleira, seus tênis com luzes rangendo no mármore caro.

— Podem sentar em qualquer lugar — disse Dio, sentindo-se absurdamente desajeitada em sua própria casa. — O… o sofá é confortável.

Dan guiou as meninas para o enorme sofá seccional cinza. Ele ligou a televisão, encontrando um canal de desenhos animados com facilidade praticada, e as acomodou. Então se virou para Dio.

— Cozinha? — disse ele.

Dio assentiu. Ela o levou para a cozinha imaculada de aço inoxidável que raramente usava. Encostou-se na ilha de mármore, precisando do apoio.

— Fale — disse ela.

Dan enfiou a mão no bolso da jaqueta e tirou o celular. Tocou na tela algumas vezes e deslizou o aparelho pela ilha em direção a ela. — Mantive cópias digitais — disse ele. — De tudo. Apenas para o caso de sua mãe decidir mudar de ideia e vir atrás de mim pela custódia.

Dio olhou para o telefone. Renúncia aos Direitos Parentais. Seus olhos percorreram o jargão jurídico, a linguagem clínica e fria desmantelando uma família. E então ela viu, no final da última página.

Dio Adawale.

Era a assinatura dela. As curvas estavam certas. A inclinação afiada do “D” estava certa. Parecia exatamente com o autógrafo que ela assinara em contratos de fusão de bilhões de dólares.

— Ela veio até mim três dias após o acidente — disse Dan, a voz baixa e rouca. — Eu ainda estava na sala de espera do hospital. Não tinha dormido. Estava apavorado. Os médicos não me deixavam ver você. Disseram que você estava em estado crítico, que seus sinais vitais estavam instáveis. — Ele agarrou a borda da ilha, os nós dos dedos brancos.

— Sua mãe saiu. Ela me sentou. Ela parecia triste, Dio. Ela realmente chorou. Ela me disse que o trauma do acidente induziu o parto. Que as bebês nasceram prematuras, mas estáveis. Mas ela disse que você… disse que você acordou, as viu e entrou em pânico.

Dio sentiu a bile subir na garganta. — Pânico?

— Ela disse que você culpou a gravidez pelo acidente. Disse que você gritava que elas tinham arruinado sua vida, que você não as queria, que não podia ser mãe e dirigir a Aether Systems. Ela disse que você exigiu que elas fossem levadas embora.

— E você acreditou nela? — perguntou Dio, a voz trêmula de traição. — Você me conhecia, Dan. Sabia o quanto eu as queria. Nós pintamos o quarto delas juntos!

— Eu não queria acreditar nela! — retrucou Dan, a voz falhando. — Eu exigi ver você. Mas ela me mostrou isso. — Ele apontou para o telefone. — Ela disse que você assinou uma hora depois de acordar. Disse que se eu pegasse as meninas e saísse do país, ela me daria a custódia total e um fundo fiduciário de cinco milhões de dólares para elas. Se eu lutasse, ela disse que me enterraria no tribunal, provaria que eu era um pai inapto e colocaria as meninas no sistema de adoção só para me punir.

Ele olhou para ela, com lágrimas nos olhos. — Eu não aceitei o dinheiro, Dio. Rasguei o cheque dela. Mas peguei as meninas. Eu tinha vinte e seis anos, era um designer gráfico freelancer contra o Império Adawale. Pensei que estava salvando-as de uma mãe que as odiava.

Dio encarou a assinatura na tela. A sala girou.

— Que data está neste documento? — perguntou Dio, a voz mal passando de um sussurro.

— 14 de novembro — disse Dan. — Cinco anos atrás.

Dio fechou os olhos. 14 de novembro.

— Dan — disse ela, abrindo os olhos. — Olhe para a assinatura novamente.

— Olhei para ela por cinco anos.

— Olhe para a inclinação — insistiu ela. — É perfeita. É firme. Sólida.

— E?

Dio levantou a mão direita. Ela puxou a manga do suéter de caxemira, revelando uma cicatriz cirúrgica longa e fraca que ia do pulso até a metade do antebraço.

— Em 14 de novembro — disse Dio, a voz tremendo com fúria reprimida — meu braço direito estava estilhaçado em três lugares pelo impacto da coluna de direção. Eu estava em coma induzido para controlar o inchaço cerebral. Eu só acordei em 28 de novembro.

Dan congelou. Ele olhou para o braço dela, depois de volta para o telefone.

— Eu fisicamente não poderia ter segurado uma caneta — disse Dio. — Muito menos assinado meu nome com esse tipo de precisão. Essa assinatura não é minha, Dan. É um traçado. Ou um carimbo. Ou uma falsificação.

O silêncio que se estendeu entre eles foi pesado, preenchido pelo som de rachadura da realidade se partindo.

— Ela me disse… — A voz de Dio falhou. Ela teve que segurar o balcão para ficar de pé. — Ela me disse que abortei no impacto. Quando acordei no dia 28, ela estava sentada ao lado da minha cama vestida de preto. Ela me disse que não havia batimentos cardíacos quando cheguei ao hospital. Ela disse que você tinha vindo me ver, ouvido a notícia e ido embora. Ela disse que você não conseguiu lidar com a tragédia. Ela disse que você me culpava.

O rosto de Dan desmoronou. — Eu mandei cartas. Centenas delas.

— Nunca recebi.

— Mandei fotos — sussurrou Dan. — Do primeiro aniversário. Dos primeiros passos.

— Nunca vi. — Dio sentiu as lágrimas, quentes e rápidas, em seu rosto.

— Passei dois anos em terapia, Dio — disse Dan, a voz quase inaudível. — Dois anos tentando me perdoar por matar minhas filhas. Visitei um túmulo vazio todo ano em 14 de novembro.

Dan contornou a ilha. Ele se moveu devagar, como se estivesse se aproximando de um animal ferido. Parou na frente dela.

— Fomos enganados — disse ele. A raiva em sua voz sumira, substituída por um horror oco e devastador. — Ela jogou com nós dois. Ela queria você de volta na empresa, sem distrações. E queria as “crianças mestiças” fora de cena.

Dio assentiu, incapaz de falar. O luto era um peso físico pressionando seus pulmões. Mas, sob o luto, o motor de sua personalidade — a maquinaria fria e calculadora da CEO — começava a girar. Elena Adawale. Sua mãe. A Presidente do Conselho. A mulher que cuidara dela até recuperar a saúde.

Dan estendeu a mão. Ela pairou por um segundo, depois ele pegou gentilmente o pulso cicatrizado dela. Seu polegar passou pela velha linha cirúrgica.

— Elas são reais, Dio — disse ele suavemente. — Estão na sala ao lado. Não estão mortas. Você não as matou.

Dio olhou para cima, para ele. — Eu perdi tudo.

— Você perdeu o começo — corrigiu Dan. — Não precisa perder o resto.

Um grito de risada explodiu na sala de estar. Foi seguido pelo baque de pés pulando do sofá. Dio se virou para o arco aberto. Viu Ari perseguindo Amara ao redor da mesa de centro. Amara ria, agarrada a uma almofada.

— Amara gosta de desenhar — disse Dan, observando-as. — Ela é quieta, observadora. Como você. Ari é barulhenta. Quer ser astronauta. Come tudo o que vê pela frente.

Dio limpou o rosto com as mãos, borrando a maquiagem, sem se importar. — É mesmo?

— Sim. E ela ronca.

Dio soltou uma risada úmida e trêmula. — Eu ronco.

— Eu sei — Dan sorriu tristemente. — Eu lembro.

A campainha tocou. A pizza.

Dio se endireitou. Ela respirou fundo, juntando os pedaços de si mesma. O luto ainda estava lá, enorme e pontiagudo, mas ela o encaixotou. Tinha trabalho a fazer. Tinha uma guerra para começar. Mas primeiro, tinha uma tarefa mais aterrorizante.

— Não sei como falar com elas — admitiu Dio, olhando para as meninas. — Eu… não sou boa com crianças. Não sou calorosa, Dan. Você sabe disso.

— Você não precisa ser “Mãe” hoje à noite — disse Dan. — Apenas seja a Dio. Comece por aí. — Ele apertou o pulso dela uma última vez, depois soltou. — Vou pegar a pizza. Você… vá dizer oi.

Dan caminhou para o saguão. Dio ficou sozinha na cozinha por um momento. Viu seu reflexo na janela escura: o terno afiado, o cabelo severo, o rosto manchado de lágrimas. Pegou um guardanapo e limpou o rímel debaixo dos olhos. Respirou fundo.

Ela entrou na sala de estar.

Ari parou de correr. Olhou para Dio, ofegante. Amara espiou por trás do sofá.

— A pizza chegou? — perguntou Ari.

— Está vindo — disse Dio. Ela caminhou até a mesa de centro e sentou-se no chão. Era desconfortável com a saia, mas ela fez mesmo assim. Ficou na altura dos olhos delas.

— Seu pai disse que você gosta de desenhar — disse Dio para Amara.

Amara hesitou, depois assentiu.

Dio pegou a bolsa na mesa lateral. Tirou um tablet prateado elegante e uma caneta stylus. Era um protótipo da Aether Systems, valendo mais do que a maioria dos carros.

— Este é um tipo especial de papel — disse Dio, ligando a tela. Ela brilhou suavemente. — Você pode desenhar nele e as cores nunca acabam. — Ela o estendeu.

Amara deu um passo à frente, atraída pela tecnologia como uma mariposa pela chama. Pegou a caneta. Fez um traço experimental. Uma linha azul brilhante apareceu. Seus olhos se arregalaram.

— Uau — disse Ari, inclinando-se.

— Você pode tentar também — disse Dio para Ari. — Mas tenha cuidado. É vidro.

— Eu sou sempre cuidadosa — mentiu Ari instantaneamente.

Dio sorriu. Era uma coisa pequena e frágil, mas era real. — Aposto que sim.

Enquanto Dan voltava com as caixas de pizza, parou no corredor. Observou Dio Adawale, a rainha do gelo da logística, sentada no chão de sua cobertura multimilionária, ensinando duas garotinhas a selecionar o pincel rosa neon em um tablet. Viu a maneira como Dio olhava para elas — como se fossem as únicas coisas no mundo que importavam.

Ele soube então que Elena Adawale cometera um erro de cálculo fatal. Ela presumira que a ambição de Dio era seu impulso mais forte. Ela estava errada. O impulso mais forte de Dio era a propriedade. E ela acabara de perceber que alguém roubara o que era dela.